O palhaço do rock dá adeus: os 45 anos do último show do baterista Keith Moon

Keith Moon (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Um pobre menino triste, que só conseguia se divertir e mostrar quem era sentado em um kit de bateria. E então o garoto baixinho do oeste de de Londres se transformava na locomotiva sonora que demolia ambientes e empurrava a sua banda ladeira abaixo.

Keith Moon irradiava rebeldia e anarquia nos shows da banda inglesa The Who e na vida louca e desregrada na capital britânica e no tempo em que morou em Los Angeles, na Califórnia, mas nunca escondeu que era uma pessoa melancólica e solitária sem as luzes da ribalta e sem o rock pesado para lhe dar suporte.

Foi em dezembro de 1977 de que Moon fez o seu último show de verdade, no Kilburn Theatre, em Londres. Meio fora de forma, sem muito ensaio, não lembrava a máquina de ritmo que sempre foi e que transformou The Who em uma usina de sons e de rock enérgico e totalmente sem rumo – e bastante pesado em seu auge.

Keith Moon, possivelmente o melhor baterista da história do rock, azucrinava, brincava, detonava e não parava quieto para tentar domar a hiperatividade e esquecer a solidão.

Moon, o Louco, da banda The Who, não era apenas força de expressão: ele agia como um louco e maníaco e fazia todo mundo crer que realmente tinha duas personalidades. Generoso, amoroso, brincalhão; perverso, maldoso, cínico, vingativo, ciumento e sabotador e autodestrutivo. Essa é a imagem terrível que fica quando se lê a biografia “Keith Moon – A Vida e a Morte de Uma Lenda do Rock”, de Tony Fletcher.

Diante das informações que lemos no texto, dá para imaginar como o transtornado músico estava vivendo em últimos meses – e como deve tr sido o martírio dele em seu último show, em 15 de dezembro de 1977, em Londres.

É evidente que não dava para cravar, na época, que seria o seu último show – morreria nove meses depois, em setembro de 1978, como consequência de uma overdose de medicamentos para combater o alcoolismo. No entanto, o atormentado baterista já dava sinais de que estava, no mínimo, desgastado e precisando de ajuda.

A última atuação de Moon em um palco de verdade foi gravada em vídeo e lançada em 2010 com o nome de “Live At Kilburn”. É um epitáfio comovente, onde o baterista se esforça, dá o sangue e tenta reviver os seus melhores momentos, mas com pouca eficácia.

Naquele dia, em Kilburn, em uma apresentação pra convidados e fãs mais dedicados, o quarteto buscava algum tipo de redenção, por mis que não admitisse. Foi um show meio “chutado”, sem grande empolgação, com erros bobos além de conta e sem tanta dedicação.

Moon, afundado na bebida e nas drogas e jogando no lixo todos os tratamentos de reabilitação, tinha gravado um fracassado álbum solo – “Two Sides of the Moon”, em 1975 – e ainda não aceitava a separação e divórcio da esposa, Kim. 

Depois das filmagens do longa-metragem “Tommy”, também em 1975, e do fim, da turnê americana do mesmo ano, ficou à deriva. Só sobrou o álcool como companhia, seja em casa ou nas intermináveis noites pelos clubes noturnos de Londres. Para piorar, suas finanças pessoais, por conta dos gastos exorbitantes e desperdícios diversos, estavam no fundo do abismo.

Após o show nem um pouco memorável n Kilburn Theatre, o baterista entrou em parafuso. No meses seguintes, Moon continuou enfiando o pé na jaca, intempestivo, ciclotímico e com o humor oscilante, mas alguma coisa mudou. Já não estava mais disperso e displicente, e mostrou isso no estúdio, durante as gravações do disco “Who Are You”, de 1978, lançado um mês antes de sua morte.

Ainda apresentava algumas dificuldades no estúdio antes inimagináveis, como na jazzística “Music Must Change” e na eletrônica “905”, só que compensava com um certo brilho nos olhos de quem curtiu bastante voltar às gravações.

Também estava empolgado com o projeto do filme “The Kids Are Alright”, uma espécie de documentário sobre a banda cm base em compilações de vídeos feita por um ardoroso fã.

A fita teria como ponto alto a exibição de dois “videoclipes” ao vivo de “Baba O’Riley” e “Won’t Get Fooled Again”, em registro de palco feito no começo de 1978 no Shepperton Film Studios, em Londres, com a presença de pouco mis de 400 espectadores – convidados, funcionários do local e do próprio filme.

Keith Moon continuava na vida de excessos e chegou ás gravações em estado lastimável, mas se transformou quando se sentou no kit de bateria.

Recuperou a aura de indomável e tocou bem como há muito não o fazia, tanto que colaborou muito para que a banda fizesse a melhor performance ao vivo de “Won’t Get Fooled Again” de sua história. O solo final de bateria é estupendo.

Em muitos aspectos, dá para dizer que essa performance o redimiu do quase fiasco de Kilburn meses antes, e poderia até enganar os menos informado a respeito do futuro da banda. Parecia que havia uma chance séria de recuperação do louco baterista.

Bem que ele tentou ficar longe dos excessos nos últimos meses de vida, mas as recadas eram muitas. Em um tratamento alternativo, digamos assim, passou a tomar remédios contra o alcoolismo – sem parara de beber. Não tinha como dar certo.

Em 7 de setembro de 1978, esteve presente na estreia de um filme sobre Buddy Holly, em Londres, produzido e financiado por Paul McCartney. Na festa, não bebeu as quantidades industriais que costumava beber, mas incomodou alguns convidados com falas inconvenientes e desconexas. 

Acabou indo embora cedo – ironicamente, a última pessoa com quem conversou foi Kenney Jones (ex-Faces e Small Faces), que viria a substituí-lo no Who um ano depois. 

Acreditando em milagres, abusou do remédio antiálcool alternativo, como se fosse fácil curar  doença com comprimidos. Tomou um monte deles e sofreu uma overdose durante a madrugada. Foi encontrado morto, na manhã seguinte,  pela namorada sueca.

O gênio da bateria morreu aos 32 anos de idade quando ensaiava uma recuperação artística mesmo que se recusasse a tratar a doença. Kilburn foi a derradeira visão de um baterista genial longe de sua forma, mas não fez jus à genialidade e criatividade de Keith Moon.

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